15 anos do MídiaQ – qualidade no audiovisual infantojuvenil
A pesquisa MídiaQ completou 15 anos. Mais que um levantamento sobre qualidade e responsabilidade social no mercado audiovisual infantojuvenil brasileiro, o MídiaQ se tornou um marco de pesquisa no meio e se mantém como referência para diversos produtores audiovisuais dedicados à criação de vídeos, programas, séries e filmes dirigidos a crianças e adolescentes.
O Prêmio MídiaQ foi criado em 2004 pelo Midiativa – Centro Brasileiro de Mídia para Crianças e Adolescentes, após a realização da pesquisa com crianças, além de mães e pais com filhos de 4 a 17 anos, das classes A, B e C, sobre a qualidade da programação da TV aberta no Brasil.
O levantamento feito pela Multifocus Pesquisa de Mercado e a equipe Midiativa, organização criada no ano de 2002, revelou o que as crianças preferiam ver na televisão e o que as famílias esperavam das produções numa época em que a oferta de programação televisiva adequada para o público infantil estava rareando no Brasil.
“Era uma época de poucos programas e não eram tantas as TVs por assinatura dedicadas 24 horas para crianças. Não existiam ainda os 12 canais dedicados a diferentes faixas etárias e gêneros como vemos hoje. Nada de streaming ou de escolhas via internet, Youtube, etc…Mas o que existia sim era uma preocupação na sociedade pela ‘baixaria’ na TV e o amplo acesso das crianças a todo tipo de programação”, lembra Beth Carmona, diretora presidente do Midiativa.
“Por isso nossa ideia foi reforçar e discutir a qualidade, buscando um lado positivo da influência da TV, já demonstrado na época pela programação vencedora da TV Cultura, e ressaltando a necessidade de se produzir programação original e relevante para as crianças brasileiras”, complementa Beth Carmona.
O que as crianças preferiam assistir na programação de TV da época? E o que mães e pais aprovavam nessa mesma oferta televisiva consumida por seus filhos? O levantamento mostrou que os programas televisivos mais consumidos pelas crianças no país eram aqueles dirigidos aos adultos, por falta de diversidade e qualidade na oferta de produções mais especializadas no público infantil.
A pesquisa teve amplo apoio do Unicef e recebeu patrocínio da Fundação Avina, além da divulgação e promoção do Meio & Mensagem. “Queríamos chamar a atenção dos anunciantes, dos dirigentes de emissoras e dos pais das crianças, além dos produtores audiovisuais”, lembra Beth Carmona.
Parâmetros de qualidade
O relatório final do MídiaQ originou uma série de postulados sobre qualidade audiovisual infantil, que Beth Carmona considera como parâmetros norteadores e critérios de avaliação para a leitura crítica da qualidade dos programas.
“A pesquisa MídiaQ revelou parâmetros de qualidade entre preferências do público infantil e valores considerados como relevantes na TV, na opinião de mães e país. São dez premissas que ajudam a nortear produtores audiovisuais e outros criadores do meio cultural em geral, na interlocução com o público infantojuvenil. São parâmetros que apontam caminhos possíveis na direção da diversidade e da qualidade no audiovisual. Apesar de ainda válidos, mereceriam uma revisão, frente às discussões de identidade de gênero, diversidade de etnias e outras questões da atualidade”.
E o que é qualidade? Ao ouvir crianças e adultos, a pesquisa MídiaQ, 15 anos atrás, ajudou a tatear marcadores culturais da qualidade no audiovisual, um conceito de variações de tempos, espaços e subjetividades. Foram apontados parâmetros considerados relevantes para uma produção audiovisual infantojuvenil, com atributos para:
1. Ser Atraente
Um programa que fale a linguagem dos jovens, que tenha música, ação, competições, movimento e humor.
2. Gerar Curiosidade
Mais do que transmitir informação, um programa de qualidade deve gerar interesse por outras áreas como esporte, música, cultura…É importante que o programa desperte a curiosidade e o gosto pelo saber.
3. Confirmar Valores
Transmitir conceitos como: Família, Respeito ao próximo, Solidariedade, Princípios éticos.
4. Ter Fantasia
Estimular a brincadeira, a fantasia, fazer sonhar.
5. Não Ser Apelativo
Não banalizar a sexualidade e não usar um vocabulário chulo. Mas, é também não explorar a desgraça alheia e o ridículo, não incentivar o consumismo, não mostrar o consumo de drogas e o comportamento violento como uma coisa normal.
6. Gerar Identificação
Colocar personagens, temas e situações que tenham a ver com essa geração. Para os pais é importante que seus filhos vejam suas dúvidas, seus confrontos e anseios sendo discutidos nos programas de televisão, que se identifiquem com as situações e extraiam daí algum ensinamento.
7. Mostrar a Realidade
Para os pais, é importante que o programa não mostre um mundo que não existe, que não iluda ou falseie a realidade.
8. Despertar o Senso Crítico
Para os pais o programa de qualidade é aquele que leva o jovem a refletir e dá espaço para ele pensar e montar uma visão crítica.
9. Incentivar a Autoestima
Respeitar e valorizar as diferenças, não transmitir o preconceito e a discriminação através de estereótipos.
10. Preparar para a Vida
Abrir os horizontes, mostrar opções de vida que ajudem o jovem a escolher seu direcionamento.
Saiba mais sobre os resultados e a metodologia da Pesquisa MídiaQ, que completa 15 anos.
Público jovem
Em 2005 a segunda edição da pesquisa focou no público de 12 a 17 anos de idade e foi ampliada para a classe D, além de sondar também a opinião sobre programas da TV por assinatura. Entre o público de 12 a 17 anos, a constatação era de problemas de identificação entre os jovens espectadores e a oferta de programação.
Os aparelhos de TV continuam ligados, mas não necessariamente cativam os jovens espectadores. Uma parte de sua atenção acompanha o seriado, a novela, o programa de variedades, o clipe musical ou o noticiário, enquanto outra está atenta às mensagens do Messenger, do celular, ou baixando músicas no Kazaa. Tudo ao mesmo tempo: esse é o lema e a principal habilidade dessa geração. (Pesquisa MídiaQ, 2005)
Essa era a constatação de novos perfis de comportamento que só viriam a se acentuar desde então, até o atual cenário contemporâneo de efervescência da interatividade. Beth Carmona pontua a importância do olhar para esse público: “Foi um momento importante para reflexão sobre o papel dos meios de comunicação frente a esse público em franca transformação no consumo de mídias cada vez mais diversas, mas com programação nem sempre à altura da demanda por produções com mais potencial interativo e com mais capacidade de contribuir com a formação crítica desses jovens.”
Prêmio MídiaQ
A pesquisa originou a criação do Prêmio MídiaQ, que deu maior visibilidade a programas de TV que à época tinham a preferência de crianças e jovens e também eram indicados por pais e mães como referência em convergência de qualidade em entretenimento e adequação ao público infantojuvenil. A premiação, dirigida a produtores de TV, anunciantes e profissionais da mídia, era uma iniciativa de valorização de programas com características relevantes entre os parâmetros de qualidade, para estimular novas iniciativas e investimentos na área.
No diagnóstico da pesquisa, a criança era tratada pelo mercado de forma homogênea, um cenário bem diferente do atual, agora marcado pela criação de canais e programações segmentadas por faixa etária na TV por assinatura. Ana Helena Meirelles Reis, presidente da MultiFocus Pesquisa de Mercado, que realizou a pesquisa, destaca essas diferenças:
– Foi sem dúvida o primeiro momento de construção de parâmetros de qualidade para uma programação voltada à infância e adolescência, num ambiente em que ainda não existiam movimentos no Brasil com esse foco. Vale lembrar que nessa época a relação entre produção e consumo audiovisual pela infância era de via única, ou seja, a televisão estabelecia a sua grade de programação, e não havia ainda a opção de escolha de outros conteúdos em outras plataformas. Os resultados da pesquisa causaram grande impacto por revelarem uma consciência muito clara por parte tanto dos pais como de seus filhos a respeito dos valores que esperavam ser transmitidos na produção de conteúdo audiovisual.
Confira a entrevista completa com Ana Helena Meirelles Reis, presidente da MultiFocus.
Img: Castelo Rá-Tim-Bum, TV Cultura, programa vencedor do Prêmio MídiaQ dos 4 aos 11 anos.