Publicidade para crianças no Brasil

Para angariar apoio de pais, mães e entidades organizadas da sociedade, a Abap (Associação Brasileira de Agências de Publicidade) e a ABA (Associação Brasileira dos Anunciantes) resolveram se manifestar sobre o debate da propaganda infantil no Brasil e têm divulgado estudos, levantamentos e campanhas que defendem a atuação do Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária) como suficiente para fiscalizar e punir excessos do setor.

Agências de propaganda e anunciantes reconhecem que são necessários cuidados mais específicos para criar anúncios para o público infantil, mas rechaçam a proibição que, segundo eles, configuraria em cerceamento da informação, além de tentativas de isolamento das crianças no inevitável mundo multimídia em que elas já estão inseridas.

Ainda defendem que a obesidade, o sedentarismo e o consumismo entre as crianças sejam debatidos e enfrentados por toda a sociedade e não atribuídos somente ao poder de persuasão da propaganda.

A campanha Somos Todos Responsáveis, da ABAP, que está no ar desde 2012, tem esse objetivo. “O discurso que não acrescenta em nada a essa discussão é colocar a publicidade como a grande vilã e os pais e mães como reféns da vilania dos publicitários e anunciantes. Nossa sociedade está bem mais madura do que isso”, defende Alexandre Secco, diretor da Medialogue, que conduziu o projeto.

A associação criou uma série de cartilhas digitais que admitem a ligação, em algum nível, entre a obesidade infantil, o consumismo e a propaganda, mas sustenta que os pais e os educadores têm poder de influência preponderante para influenciar padrões de comportamento infantil.

Reação na internet

A campanha teve impacto dos dois lados e também fomentou uma reação na internet. Em resposta à iniciativa da Abap, nasceu o grupo Infância Livre do Consumismo, que refuta a alta responsabilização da família no consumo da mídia exposta às crianças. O coletivo reúne “mães, pais e cidadãos inconformados” com a publicidade infantil e pede uma fiscalização do governo sobre os anúncios.

A Associação Brasileira dos Anunciantes (ABA) endossa a posição contrária. “Não podemos defender a interferência do Estado na vida das empresas, na liberdade de informar, na liberdade de expressão e nas fontes de financiamento da mídia”, declara o vice-presidente executivo da ABA, Rafael Sampaio.

Para o coletivo Infância Livre do Consumismo e outras entidades que questionam o impacto negativo da propaganda entre os pequenos, a campanha das agências publicitárias é uma “cortina de fumaça” para diluir a responsabilidade do mercado no direcionamento de propagandas às crianças. Para saber mais dos argumentos dos grupos organizados que são contra a publicidade infantil, clique aqui.

Alexandre Secco rebate a crítica. “Não existe uma máquina de produzir irregularidade ou prejuízo a crianças. Agências e anunciantes têm se compromissado em adequar essa linguagem infantil. Até por uma questão prática, porque ninguém quer ter o anúncio em risco”, afirma.

Além da campanha, a ABAP e a ABA divulgam pesquisas de mercado para mostrar que o ambiente da propaganda no Brasil está se adequando às novas demandas da sociedade organizada.

A ABAP fez um levantamento sobre as quase 300 peças publicitárias infantis que passaram pelo julgamento do Conar desde setembro de 2006 – quando entraram em vigor as novas regras do conselho.

Nesta data foi proibido o emprego de crianças e adolescentes para vocalizar apelos de consumo e foi ainda banido o emprego de mensagens que, por meio dos menores, provoquem constrangimento aos pais, coagidos ao consumo.

“Identificamos os erros mais comuns e os tipos de peças mais punidas pelo Conar para contribuir com informações ao mercado e evitar que os erros sejam repetidos” , explica Alexandre Secco.

As três queixas mais frequentes sobre as propagandas denunciadas durante o período foram feitas em razão de: apelo imperativo de consumo (34%), incentivo a conduta inadequada (9%) e vocalização de consumo pela criança (7%).

Conar e a adesão do mercado

O estudo divulgado pela ABAP mostra ainda um balanço positivo da atuação do Conar, criticado por entidades que acusam o conselho de falta de pluralidade e de defesa unilateral do mercado.

O Conar se defende das críticas. Segundo o presidente-executivo do conselho, Edney Narchi, entre o recebimento da denúncia e o julgamento inicial passam-se, em média, 45 dias e a recomendação da entidade tem efeito imediato, ainda que caiba recurso.

Segundo o Conar, em 35 anos de atividade nunca houve desrespeito às recomendações do conselho. “Ao lado do sistema inglês, que é uma cooperação bem-sucedida entre governo e autorregulação, o Brasil tem o sistema mais eficiente do mundo. Aqui funciona porque a mídia adere maciçamente ao Conar, 100%”, afirma Rafael Sampaio, da ABA.

Para refutar as acusações de que o Conar é condescendente com os abusos da propaganda, o levantamento da Abap atesta que o conselho de autorregulação determinou punições em 65% dos casos denunciados desde 2006 e que 80% das agências que tiveram as campanhas punidas não voltaram a sofrer penalizações.

O levantamento ainda mostra que metade das denúncias sobre publicidade infantil abusiva partiu de cidadãos comuns, o que para a Abap comprova a força que a sociedade já exerce para controlar a propaganda.

A indústria de alimentos, bebidas e fast-food é a mais denunciada e a mais punida por infringir as regras de propaganda infantil.

Novas demandas

Com ou sem proibição, o mercado publicitário brasileiro terá de responder às novas demandas de linguagem e tratamento com as crianças. Metade das denúncias feitas ao Conar sobre propaganda infantil foram embasadas em expressões como: “acesse”, “colecione”, “envie”, “experimente”, “leve”, “não perca”, “peça” e “venha”. A frase mais repetida nas campanhas denunciadas voltadas para o público infantil é: “Peça já o seu”.

Para Rafael Sampaio, da ABA, há espaço para a evolução da autorregulação, um movimento que, segundo ele, está em efervescência no resto do mundo.

Giovana Botti

Redatora do site

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